quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Crónica Diária - Rádio Altitude

Continuando as reposições, dia 30 de Novembro foi assim:

"Nos próximos dias, muitos de nós realizarão uma fantasia: viajar no tempo! Com a introdução de portagens nas auto-estradas A23 e A25 e com a redução do rendimento disponível das famílias que tem marcado a actuação do actual Governo, pela via da nacionalização de uma parte crescente dos rendimentos do trabalho, muitos de nós passaremos a deslocar-nos de forma idêntica àquela em que o fazíamos há cerca de 30 anos: por estradas nacionais, passando pelo centro de todas as pequenas localidades e a velocidades médias incompatíveis com as necessidades actuais. Tudo isto contribuirá, na minha opinião, para o afastamento do interior das regiões mais desenvolvidas, quer em termos de condições de vida, quer de ambiente propício para negócios, quer mesmo no sentido físico do termo. Por isso, fiquei um pouco perdido ao ter tomado conhecimento do apelo do Sr. Presidente da República para a criação de incentivos à fixação de populações nas zonas rurais, no mesmo dia em que promulgou o Decreto-Lei que determina a introdução de portagens nas auto-estradas do interior. Mesmo estando já habituados a estes anacronismos de Cavaco Silva, fico sem perceber se são acidentais ou propositados. Apesar de o Presidente da República dispor dos meios para ter uma palavra a dizer em questões como esta – nomeadamente o veto político – optou por não o usar neste caso concreto. De resto, numa atitude mais do que previsível, como as restantes que têm marcado o seu mandato. E mostrando que, com Cavaco Silva, a Presidência da República se fica por um verbo de encher, com um actor que fala, fala, mas ninguém o vê a fazer nada! Esta medida em particular será o maior e mais irresponsável ataque do poder central ao interior menos desenvolvido de um Portugal que será cada vez mais assimétrico, perante o olhar complacente mesmo daqueles que elegemos para representar os nossos interesses. A austeridade será pois, de igual forma, assimétrica, por atingir cegamente regiões com índices de poder de compra muito distintos. E esta cegueira conduzirá, em minha opinião, a uma situação pior que a que vivemos hoje, porque não serão feitas algumas correcções que se impõem. Isso mesmo avisou Joseph Stiglitz na semana passada ao povo espanhol, numa conferência em La Coruña. O nobel e ex administrador do Banco Mundial, referindo-se às políticas de austeridade que instituições internacionais como a União Europeia e o FMI têm imposto àqueles a quem prestam auxílio, disse claramente que a austeridade é a receita para o suicídio. Que sem estímulos ao investimento e à criação de emprego, pela via da fiscalidade, e ajustamentos à despesa, as recessões demorarão muitos anos a ser ultrapassadas, massacrando os povos a ela sujeitos. Sabendo que em qualquer situação, os estímulos ao investimento e à criação de emprego têm conduzido a situaçoes favoráveis do ponto de vista do dinamismo das economias – veja-se o exemplo das economias dos países do Norte da Europa, que o souberam fazer melhor do que ninguém pela flexibilidade que a sua escala lhes permite – essa deveria também ser uma receita aplicada entre nós. Alguns membros do Governo têm ainda um capital de credibilidade bastante elevado, entre os quais o Ministro das Finanças. Por isso, tenho alguma esperança que este possa vir a ser um caminho que iniciemos, apesar de os sinais de que dispomos até agora nos indicarem o contrário De qualquer das formas, alguns de nós continuarão teimosamente a viver no interior, a tentar pelos meios ao seu alcance que as desigualdades se atenuem. Uns porque gostam da sua terra, outros porque gostam da vida que lhes é proporcionada. Por tudo isto, nós que vivemos no interior, esperávamos mais dos nossos políticos; que pelo menos percebessem que um interior mais competitivo contribuirá para um país mais forte economicamente. E que um interior por eles afastado, afastar-se-á também na direcção oposta, tal como já fez anteriormente em contextos de grande dificuldade. Lembram-se dos contrabandistas…?"

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