sexta-feira, 29 de abril de 2011

Crónica Diária - Rádio Altitude

Crónica desta semana:

Comemorámos esta semana 37 anos sobra a data que mais profundamente marcou Portugal nos últimos anos. Na mesma altura em que pela terceira vez na nossa história recente temos em casa os técnicos do FMI auditando as nossas contas com vista a um resgate financeiro.

As televisões brindaram-nos com as habituais entrevistas, ao cidadão comum e a um conjunto de homens que estiveram mais directamente ligados ao movimento que iniciou a revolução – o MFA - dando-nos uma imagem que vai da indiferença de alguns, à crispação de poucos, com o rumo que as coisas tomaram. Acabando, invariavelmente, pela pergunta que há anos ouço ser feita neste dia: “Será que valeu a pena?” Ora, para mim, o facto de a pergunta poder sequer ser feita é, por si só, a melhor resposta. Não são precisas mais palavras.

Tendo passado 37 anos, acho de certa forma natural que as comemorações não assumam hoje a importância que assumiram no passado. Parece-me óbvio, que aqueles que viveram os acontecimentos tenham ficado de tal forma marcados por eles que será sempre um momento central das suas vidas. Para os restantes, dando-se-lhes mais ou menos relevância, faz parte da história. Apenas isso. Com a ressalva de que é o acontecimento histórico que mais reconhecimento tem entre a população.

O momento que vivemos é doloroso: o nosso orgulho, a nossa soberania, os nossos ideais – tudo tem sido posto em causa pela maldita crise. Mas mesmo na situação difícil em que estamos, acho que vale a pena arregaçar as mangas e ir à luta pelo nosso País. Mesmo não sendo tudo aquilo que gostaríamos, ainda assim vale a pena.

Porque, apesar das injustiças, não perdemos a capacidade de nos indignarmos com elas. Porque apesar da pobreza, somos um povo solidário. Porque apesar dos problemas no ensino, continuamos a preocupar-nos em ser melhores, em fazer mais com menos.

O nosso País tem paisagens deslumbrantes, com montanhas que nos esmagam na nossa pequenez, com um mar imenso que nos abre todos os horizontes, com um céu limpo que nos deixa sonhar com dias melhores.

Temos uma planície imensa, que a qualquer hora e em qualquer dia, nos permite escutar o silêncio e encontrarmos a nossa paz; temos montanhas cheias de vida, que a cada ciclo nos lembram que o tempo tudo renova e que o futuro é um símbolo da renovação.

Temos um património gastronómico diversificado, de grandes contrastes, que faz jus à nossa fama de povo engenhoso na hora de enganar as dificuldades. Talvez porque há muito tivemos de ganhar essa capacidade…

Somos um país de gente educada, que em todo o mundo é bem recebida e em quem se pode confiar para os trabalhos mais delicados.

Também em termos económicos, temos do que nos orgulhar: diversas empresas portuguesas são líderes mundiais no seu sector de actividade e a I&D portugueses são cada vez mais considerados pela comunidade científica.

Somos um país em que na generalidade dos lugares, podemos sair de casa a qualquer hora do dia e passearmos por onde quisermos sem que ninguém nos incomode, sem grandes preocupações com a nossa segurança. Onde os amigos aparecem em casa uns dos outros, mesmo sem avisar, e são sempre bem recebidos!

Por tudo isto, eu gosto de Portugal. Gosto de cá viver, embora também gostasse que fosse melhor na justiça, na sáude, na educação.

Ainda assim, acho que vale a pena lutar por ele; para que continue a ser o nosso país, feito à nossa imagem. Tudo isso, pesados todos os aspectos negativos e positivos, vale alguns sacrifícios que de certeza teremos de fazer nos próximos anos.

Mas faz com que o sacrifício seja mais ligeiro. Sinto que no final, vai valer a pena!

Candidatos

Depois de divulgados os candidatos a deputados - que são aqueles que os nossos votos elegerão, e não o primeiro-ministro - pelo Distrito da Guarda, a desilusão é grande no que toca aos 2 principais partidos. Ambos têm como cabeça de lista pessoas que nunca por cá vimos. Que não nos conhecem, não sabem como pensamos, como vivemos. Ou seja, serão eleitos pela Guarda como poderiam ser eleitos por outro sítio qualquer.


Eu sei que os deputados, depois de eleitos devem agir sempre na defesa dos interesses do país e não do Distrito que os elegeu. Que o mandato é nacional. Mas por alguma coisa cada Distrito elege um número determinado de deputados. De outra forma, os votos iam todos para o monte e quem tivesse mais, mais deputados teria eleitos. Isto deve ser para permitir que haja uma representatividade de cada uma das zonas do país. E ao colocarem a liderar as listas para deputados gente que, independentemente dos seus méritos políticos, não é de cá, está-se na minha opinião a subverter esse princípio. Estão a dar os nossos votos por garantidos, o que é sempre uma coisa que me irrita. Ainda me ia rir se as pessoas agora decidissem não votar em nenhum destes 2 partidos. E os tais 2 senhores não fossem eleitos, apesar de estarem a contar sê-lo sem margem para dúvidas. Aposto que em próximas eleições as coisas seriam muito diferentes... Mas sei que tal não acontecerá. E eles também!


Nos segundos lugares, igual desapontamento: de um lado, alguém que foi eleito e passados meia dúzia de meses renunciou ao mandato, vem agora pedi-lo de volta; do outro, o tal Sr. que à hora da consulta médica em Coimbra estava na Guarda em trabalho político, para desapontamento do clínico. Valha-nos ao menos o facto de ter posto o país à frente da sua saúde...

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Desagravo...?


Na semana passada soube pela rádio que Américo Rodrigues seria distinguido no dia 25 de Abril com a Medalha de Mérito Cultural pela Ministra da Cultura.
A primeira reacção foi de regozijo. Aprecio muito o trabalho que Américo Rodrigues tem feito no TMG, que penso que é hoje um dos ex libris da nossa cidade. Para além disso, é um cidadão participante: quando outros na posição dele ficariam quietos e calados no conforto do cargo que desempenham e da sua relevância, Américo Rodrigues optou por participar activamente na vida da cidade, não se inibindo de manifestar a sua opinião sobre o que se vai passando, mesmo quando ela não é politicamente correcta ou afronta os poderes instalados.
Não concordo sempre com ele; mas consciências e vozes livres como a dele fazem falta em todo o lado - e na Guarda são praticamente um oásis. A ele até lhe valeu recentemente um voto de repúdio na Assembleia Municipal, num episódio que envergonha aquele que deveria ser um estandarte da Democracia.
Depois de digerir a notícia, fiquei curioso: como terá sido feita a escolha da personalidade a distinguir...? Durou pouco a minha ignorância: logo no dia seguinte ouvi o Sr. Governador Civil explicar que tinha sido ele a propôr o nome de Américo Rodrigues para tal distinção.
Ou seja, em mais uma acção em que a imagem da Guarda sai reforçada, há dedo de Santinho Pacheco. Que diga-se, tem feito mais pela promoção da imagem do Distrito do que qualquer outra entidade... Francamente, tenho pena que pouco mais tempo permaneça no cargo. Mas quando sair, deixará a fasquia bem alta para quem lhe suceder e sairá certamente com o apreço de muitos guardenses!
E também neste episódio, Santinho Pacheco deixou claro o seu desapego a jogos de bastidores da pequena-política, a tricas partidárias, a cumplicidades que diminuem os verdadeiros políticos.
Boa!!!, Sr. Governador.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Crónica Diária - Rádio Altitude

Mais uma crónica:

"Em 2010, segundo os últimos números conhecidos, a dívida externa de Portugal foi de 87% do PIB. Nos Estados Unidos, foi de 99%. O défice das contas do Estado foi de 8,6%. Nos Estados Unidos foi de 8,9%.
Quererá isto dizer que, a julgar pelas contas públicas, a situação dos Estados Unidos é pior do que a nossa? Não sei. O que sei é que a situação das nossas contas públicas não explica, por si só, as dificuldades que temos enfrentado em nos financiarmos nos mercados internacionais. Que levaram a que, para salvaguardar a nossa solvabilidade, tenhamos de ter pedido ajuda externa, com as penalizações que daí advirão. Porque, não tenhamos ilusões, as medidas que nos vão ser impostas não o serão para ajudar a pôr em ordem as contas públicas. Servirão, exclusivamente, para que aqueles que nos vão emprestar dinheiro recuperem o mais rapidamente o capital investido – bem como os respectivos juros – bem entendidos.
Iremos pagar esta ajuda externa com língua de palmo, sem que isso signifique que haja uma verdadeira correcção da situação que nos conduziu a este atoleiro. E iremos pagá-la adoptando uma política fortemente recessiva, que atrasará a nossa recuperação económica e comprometerá a nossa capacidade de investimento nos próximos 3 a 4 anos – a confirmarem-se os cenários que têm sido dados como mais prováveis pelos analistas, que por vezes mais não fazem do que deitar-se a adivinhar…
E isto será válido tanto para entidades públicas como privadas.
Há apenas uma pequena nuance: a austeridade não nos vai ser imposta, como alguns parecem querer fazer-nos acreditar. A austeridade em que vamos viver nos próximos anos teremos de ser nós a impô-la a nós próprios, se quisermos reunir as condições exigidas por quem nos pode emprestar dinheiro. Não é algo que vem de fora; é uma escolha nossa. Porque há sempre por onde escolher. Embora, neste caso, poucas dúvidas tenha que entre os males possíveis, a ajuda do FEEF e do FMI é o mal menor.
Se pensarmos na Guarda, a situação não é muito diferente. As principais entidades públicas vêm a sua actuação futura fortemente comprometida devido à situação difícil que o país atravessa. Nem seria de esperar que fosse diferente. Mas eu esperaria que não se manifestasse em questões tão básicas como aquelas a que vamos assistir. Se pensarmos que 2 das maiores instituições públicas da Guarda são o Hospital e o Município, e que não terão como fugir à austeridade que teremos de nos impor a nós mesmos, não será difícil perceber que alguns dos planos que estas instituições têm terão inevitavelmente de ser, no mínimo e na melhor das hipóteses, adiados.
Do lado do hospital, temo que a 2ª fase da expansão – que levaria à requalificação do pavilhão mais antigo onde ainda existem serviços em funcionamento – seja vítima deste processo. E se acho que há sacrifícios que têm de ser feitos, também confesso que não esperaria que, no sec. XXI, ainda tivéssemos um pavilhão hospitalar com as características daquele. Isto num país que se dá ao luxo de ter construído em 2004 estádios que hoje praticamente não são utilizados e que custaram milhões.
Do lado da Câmara, se já hoje se luta com dificuldade em arranjar verbas para requalificar o Parque Industrial que necessita obras há mais de 10 anos, então que fará nos anos que aí vêm... Se já hoje vive sufocada com o peso dos juros da sua imensa dívida, o que acontecerá após a mais que previsível subida das taxas de juro que já começou este mesmo mês, com o Banco Central Europeu a subir a suas taxas de referência… Mesmo sabendo que, apesar desta difícil situação, não se coibiu de adquirir recentemente mais um edifício para o seu espólio, ao invés de utilizar esse dinheiro para satisfazer compromissos anteriormente assumidos.
De uma coisa temos de nos mentalizar todos: o nosso modo de vida vai ter de ser alterado. E o sector público, neste caso, terá de dar o exemplo… Mesmo não perdendo de vista que foi o sector financeiro que despoletou toda esta situação, os políticos portugueses dos últimos 20 anos – salvo poucas honrosas excepções – foram demasiado ávidos na altura de assumir compromissos para o futuro. E o futuro chegou mais depressa do que aquilo que estavam à espera!"

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Indústria na Guarda


As 2 primeiras fábricas - merecedoras desse nome - que conheci foram a extinta fábrica da Renault e a dos Lacticínios do Mileu. A primeira porque o meu Pai lá trabalhou muitos anos. A segunda porque a visitei para fazer um trabalho escolar, quando teria uns 10 ou 11 anos.
Da primeira retenho a sofisticação do equipamento, o tamanho e organização. Da segunda, a amabilidade com que o responsável nos recebeu e nos guiou ao longo da fábrica, dos processos, dos equipamentos, não regateando tempo para todas as explicações que miúdos de 10 anos precisam para perceber como se produzem lacticínios em ambiente industrial.
A Renault, após dar lugar a Reicab, e esta à Delphi, fechou definitivamente no ano passado.
Os Lacticínios do Mileu, a crer nas notícias esta semana veículadas pelo jornal "O Interior" poderá não ter destino diferente. Ou seja, dois marcos da nossa cidade em risco de desaparecer em pouco tempo.
Leio no jornal que a sobrevivência pode estar numa candidatura ao PRODER. O que me preocupa ainda mais, porque a minha experiência na gestão de candidaturas a sistemas de incentivos públicos demonstra que muito raramente uma empresa em dificuldades tem capacidade para executar um investimento objecto de comparticipação, ainda que o respectivo projecto seja apoiado. Além de que há condições de acesso ao financiamento que uma empresa em dificuldades dificilmente ultrapassa...
O empresário diz que há mercado, mas tem dificuldades em cobrar; e aponta alguma culpa às empresas de distribuição e às suas políticas de compras. Certo é que nos supermercados que frequento, nunca vi à venda por exemplo a manteiga do Mileu, que acho muito boa.
Se calhar devíamos preocupar-nos mais em "comprar o que é nosso", da Guarda. No próximo sábado vou tentar comprar um pacote de Manteiga, antes que esgotem definitivamente...

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Sobre circos



Não, este não é um post sobre o que se tem passado no Portugal político.
O assunto é o circo, na acepção de espectáculo.
Pode até ser o maior espectáculo do mundo. Por mim, acho fantásticos os números de contorcionismo - de que os chineses são exímios praticantes -, de ilusionismo, trapezistas e, como não podia deixar de ser, tenho óptimas recordações de números de palhaços, quer ao vivo quer na televisão.
Ainda hoje, tudo isso exerce sobre mim algum fascínio; até o modo de vida daquela gente, que conhece o país como poucos, sempre de um lado para o outro.
A minha única reticência no que ao circo diz respeito prende-se com o uso de animais. Não os números que e fazem com eles; mas as condições em que são mantidos e, especialmente, em que são transportados.
Tivémos desde dia 1 de Abril um circo na nossa cidade. Entre as principais atracções, deram destaque a Tubarões do Pacífico e Focas, num aquário de 30.000 Litros.
Percebo que há 30 anos atrás, por estas paragens quase ninguém tivesse visto um tubarão ou uma foca; o Circo era, para além da componente lúdica, uma oportunidade para contactar com animais nunca vistos por estas paragens.
Mas nos dias de hoje, da TV por cabo, dos programas National Geographic, da Internet, ou do Oceanário de Lisboa, ainda fará sentido sujeitar os animais a uma vida de cativeiro e transporte em condições deploráveis para mostrar tubarões na Guarda? Não creio.
Por isso, apesar dos insistentes pedidos da minha filha, que estava muito entusiasmada com a perspectiva, disse-lhe que desta vez não lhe faria a vontade. Porque acredito que compete a nós - consumidores - dar com o nosso comportamento os sinais certos aos empresários do sector. Obviamente, quando me fôr possível, levá-la-ei (de novo...) ao Oceanário onde poderá observar esses magníficos animais com o mínimo de dignidade. Porque é da dignidade daqueles animais que estamos a falar. E porque é minha intenção educá-la no respeito pela natureza e todas as formas em que a vida nela se manifesta. Tenho a certeza que isso fará dela melhor pessoa.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

De novo... eleições!


E pronto, concretizou-se o cenário que desde há um ano e meio estava anunciado: o Governo demitiu-se, a Assembleia da República foi demitida e foram convocadas eleições para daqui a cerca de 2 meses.

Deixando de fora a campanha eleitoral, não sei muito bem o que esperar até lá.

Mas bem escusam os partidos da oposição de vir agora pressionar o Governo a tomar determinadas atitudes, alegando que está em plenas funções. Não está! É um Governo demissionário, cuja legitimidade para tomar determinadas opções é muito condicionada. Pensassem nisso antes. Agora, é cruzar os dedos até às próximas eleições, porque só depois delas teremos (espero eu) um Governo com plena capacidade para tomar as medidas que já deveriam ter sido tomadas há pelo menos 2 meses atrás...

Para o bem e para o mal, o Primeiro-Ministro-demissionário é um Homem obstinado. Não remodelou, quando pressionado a fazê-lo; não pedirá ajuda externa, apesar de todas as pressões nesse sentido. Disso estou inteiramente convicto.

Mas pensando mais no umbigo - neste caso, na Guarda - confesso que aguardo com alguma curiosidade as listas de candidatos; e mais curiosidade ainda tenho em saber o que dirão os candidatos do PS, os mesmos que na última campanha disseram à Guarda que não haveria portagens nas Auto-Estradas que nos servem e que agora votaram favoravelmente a medida, sem nunca se terem preocupado em justificar-se perante as pessoas da Guarda. Ah, e se se vier a confirmar que o Governo não pode introduzir as portagens por estar demissionário, isso não vale como desculpa alguma, uma vez que a medida foi votada na AR e - este ou outro Governo - deverão implementar as portagens a coberto dessa medida.

Crónica Diária - Rádio Altitude

A minha crónica de 30 de Abril:


"De entre a catadupa de más notícias que ultimamente temos recebido, foi quase sem surpresa que soubemos na semana passada que o chefe de Governo apresentou ao Presidente da República a demissão. Em qualquer país democraticamente evoluído, isto criaria nos cidadãos apreensão e preocupação, levando-os a envolverem-se. Como já nos tinha sido anunciada tantas vezes e há tanto tempo, a notícias chegou-nos sem grande surpresa. Como o fim de uma longa espera, que percebemos com alívio. O cenário mais provável é o de eleições antecipadas; e neste, atrevo-me a antecipar – ou pelo menos desejar – que as pessoas se mobilizem para votar em massa, para fazer uma opção clara, contrariando os elevados níveis de abstenção que se têm verificado em eleições anteriores. Mesmo sabendo que as eleições legislativas são das que mais mobilizam os eleitores… Mesmo não tendo sido divulgadas ainda propostas concretas, é importante que elas sejam conhecidas, discutidas, clarificadas. Porque há escolhas importantes para fazer. A situação das nossas finanças públicas é, como se sabe, muito delicada; exige que se tomem medidas musculadas, quanto mais depressa melhor. Sabemos que Portugal tem vivido acima das suas possibilidades e isso não era dramático num cenário de crescimento da economia mundial, porque existiam recursos financeiros abundantes e baratos que podíamos ir utilizando para sustentar os nossos vícios. Sabemos também que muitos desses recursos financeiros baratos que fomos utilizando eram, afinal, enormes bolhas especulativas. Que quando rebentaram percebemos terem afinal muito menos substância que aquela que o seu invólucro permitia adivinhar… E foi quando se percebeu que os tais recursos financeiros não eram assim tão abundantes que eles deixaram de ser baratos, como sempre acontece na economia real. E ao deixarem de ser baratos, demo-nos finalmente conta que os nossos vícios nos estão a sair demasiado caros e que teremos de passar sem eles; ou, pelo menos, sem alguns… Claro que falo aqui em vícios em sentido figurado, pois muitos deles são indispensáveis para as nossas vidas, como sejam a saúde, o direito à reforma, à educação, etc. O facto de lhes chamar vícios tem mais a ver com a forma como estão organizados do que com a substância em si, que nenhum de nós hesitaria em considerar importante. Assim, as escolhas a fazer serão quanto à forma de moderarmos o nosso apetite – e digo nosso enquanto nação – pelos nossos vícios. Não basta dizermos que temos de gastar menos e melhor; que temos de ser mais criteriosos a aplicar o nosso dinheiro. É preciso perceber exactamente como tornar esses desígnios em realidade, porque será com esta que teremos de passar a conviver no nosso dia-a-dia. Temos de exigir que tudo isto nos seja devidamente explicado, para podermos fazer as nossas opções de forma esclarecida, de acordo com aquilo que achamos que será o melhor caminho para o nosso país. Costuma dizer-se que os momentos de crise acabam por se revelar boas oportunidades de mudança, para quem vê as oportunidades que surgem com as dificuldades. E eu espero que este seja o momento em que de alguma forma os cidadãos se possam reconciliar com a política e se voltem a envolver nela, a participar. Não basta ficarmos à espera que a moralizem, que a elevem, que façam o que quer que seja. Tudo isso está nas nossas mãos; basta chegarmo-nos à frente, envolvermo-nos e darmos a cara pelas nossas opções. Isso sim será o melhor contributo para a moralização e a elevação da política. Deitemos-lhe as mãos!"