sábado, 14 de julho de 2012

Crónica Diária - Rádio Altitude

Em 16 de Maio:


Vou ouvindo, aqui e ali, avisos de quem diz que sabe. 
Que a situação pode explodir a qualquer momento. Que isto está como uma panela de pressão, que de um momento para o outro, se não libertar algum vapor, acabará por explodir. Que o povo começa a dar sinais de não aguentar muito mais. 
Mas não é isso que vejo. Vejo as pessoas com quem falo resignadas, encolhendo os ombros às injustiças de que se dizem vítimas. Olhando para o lado quando do que se fala é das injustiças de que outros são vítimas, tentando passar incólume. Vejo medo na forma de encarar as agressões sucessivas a que todos nos vemos sujeitos: carga fiscal elevada, discricionariedade das finanças na tributação, sem qualquer respeito pelos direitos do cidadãos, justiça incapaz de proteger aqueles que mais precisam. Um Estado que é hoje um pesadelo e das malhas do qual tentamos escapar antes que nos sufoque. 
Os últimos dias têm-nos mostrado que as pessoas querem realmente uma mudança, sem saberem muito bem que mudança é essa. As eleições na Grécia e na França, salvas as devidas proporções, são exemplo disso mesmo. Vê-se nos resultados que as pessoas querem uma mudança. Não só dos atores, mas das escolhas políticas. E vemos que os próprios partidos começam a revelar-se incapazes de dar às pessoas aquilo que elas procuram, aquilo que anseiam. A crise económica estará a conduzir-nos a uma crise democrática? Talvez. Está pelo menos a levar muita gente a interrogar-se se a Democracia, tal como a conhecemos, tal como evoluiu, será capaz de aguentar muitos mais anos… 
 Como forma de Governação, é sem dúvida o melhor sistema que conheço. A representatividade das pessoas, um homem um voto, é ainda aquela que oferece maiores garantias de defesa aos mais fracos. Mas as organizações que estão na base da Democracia – os Partidos – têm sido geridos quase como domínios feudais. Temos assistido incrédulos às mais inacreditáveis manobras para assaltos ao poder dentro dessas organizações. 
E quando os Partidos saem desacreditados, essa imagem transmite-se a todos os que dão a cara por ele, estejam ou não no “mesmo saco”, se me permitem a expressão. Compreensivelmente, existe hoje um conjunto de pessoas cujos valores começam a ser incompatíveis com a imagem que os Partidos dão de si, o que leva ao seu afastamento. Perdendo-se assim pessoas que, pela sua forma de estar, muito podem contribuir para a vida pública, para a renovação dos partidos e para uma mudança decisiva na imagem que os cidadão têm deles. 
Este fenómeno cria um ciclo vicioso que perturba o normal funcionamento da democracia. Enfraquecendo-a.  
O meu desejo, nestes tempos de dificuldades, é que aquilo que aflige as pessoas não lhes tolde a visão e as afaste daquilo que é verdadeiramente importante defender: a dignidade da pessoa humana, acima de todos os interesses. Qualquer que seja a pessoa. 
A história ensina-nos que em épocas difíceis, de cisões sociais, grandes grupos foram capazes de defender o indefensável, de praticar o impensável. 
Tenho a esperança que todos consigamos reunir a coragem – física, mas essencialmente intelectual – para resistir aos apelos mais fáceis e populistas e o discernimento de exigir que sejam preservados os valores sobre os quais se funda a nossa sociedade: o respeito pela pessoa, a solidariedade e o contributo de todos para o bem estar geral. 
 A resposta a estas exigências só pode ser um fortalecimento da Democracia!

terça-feira, 26 de junho de 2012

Notas

A tourada lá acabou por se realizar, apesar dos protestos.
No sábado, junto à hora do almoço, ouvi num noticiário da Rádio Altitude uma peça sobre o assunto.
A jornalista falou do evento, mencionou os protestos de associações de defesa dos animais - referindo serem essencialmente nas redes sociais, o que não é inteiramente verdade uma vez que houve outras iniciativas - ouviu o diretor da Agência de Promoção da Guarda e até um historiador local, acerca da existência nos anos 20 do século passado de uma praça de touros na Guarda, para justificar aquilo que alguns chamam tradição. Da parte das tais associações de defesa dos animais, não ouvi uma palavra.
Relativamente àquilo que disse o responsável pela Agência de Promoção da Guarda, apenas algumas notas, para encerrar este (triste) assunto:
1. tentar meter no mesmo saco uma tourada, um evento automóvel ou um evento desportivo é absolutamente desprovido de qualquer sentido; há quem não goste? Admito que sim; mas quantos protestos recebeu quando organizou o evento automóvel? E o jogo de futebol? E a tourada? Decerto este será um bom indicador da diferença colossal que separa este último dos 2 primeiros. Porque mesmo que não goste de futebol - e não gosto - sei que, para além de haver muita gente a gostar, não me compadeço da bola e dos chutos que ela leva; nem das extremas solicitações mecânicas a que é sujeito um carro de rallie; já de um animal acossado, sem hipótese de fuga e que definitivamente não quer estar ali...
2. não lhe compete decidir quem pode ou não protestar; quem protesta está no seu direito, independentemente da ligeireza com que o Sr. António Saraiva avalia a sua capacidade; conheço gente que tem cães em apartamentos que todos os dias, religiosamente, quer neve quer faça sol, leva os cães à rua mais que uma vez para o necessário exercício; como conheço gente que mora em espaçosas vivendas com bons jardins que tem o cão preso pelo pescoço o dia inteiro; portanto o tamanho da casa do autor de um protesto não é, por si só, um bom indicador da qualidade de vida do(s) animal(ais) que escolheu;
3. Dizer que se não fossem as touradas as raças de touros bravos já se teriam extinto é, para além de cópia da cartilha dos lobbies pró-taurinos, um rude golpe naquilo que a comunidade de biólogos dá por adquirido;  Darwin - que por acaso é o nome do cão da minha família - abriria a boca de espanto ao ouvi-lo...

Crónica Diária - Rádio Altitude

A crónica de 2 de Maio:


"Celebrou-se ontem mais um dia do trabalhador. A acreditar nos inquéritos das estações de televisão – que de inquérito, na verdadeira aceção do termo pouco têm – este é um feriado que cada vez tem menos significado para os portugueses. A minha geração, que atualmente representa uma parte muito significativa da força de trabalho disponível no país, entrou no mercado de trabalho quando praticamente tudo estava feito. O descanso semanal, 22 ou mais dias de férias pagas, feriados, pagamentos por horas extraordinárias, horários de trabalho legalmente limitados ou subsídios de férias e de natal são exemplos de benefícios que encontrámos e que julgámos estarem sempre assegurados. Apesar de já não sermos da geração que encarava o emprego como algo definitivo, “para a vida”, como se dizia há muitos anos atrás, achávamos que essa incerteza podia ser contornada, uma vez que vivemos um longo período de crescimento económico e em que havia trabalho para quase todos. Mas um dia percebemos que as coisas não são exatamente assim. E que os benefícios, que alguns conquistaram com longas lutas, manifestações, greves e muita diplomacia afinal poderão não estar assegurados no futuro. Das teorias clássicas da economia, capital e trabalho eram os 2 fatores de produção indispensáveis à produção de riqueza e os motores das lutas de classes que se travaram desde sempre. O Capital – fosse ele a terra, matérias primas ou, mais recentemente, o dinheiro – teve sempre a primazia sobre o trabalho porque estava concentrado nas mão de muito poucos; o trabalho, por outro lado, estava muito disperso, assim dispersando o poder que dele poderia advir. E esse poder só foi concentrado por forma a poder tratar de igual para igual o poder que advinha da posse do capital por ação de gente que lutou para mobilizar os trabalhadores; de gente que se dedicou ao sindicalismo, abdicando muitas vezes do conforto da indiferença e da sua própria segurança pessoal para lutar por uma causa de muitos. Assim foram feitas as grandes conquistas em matéria de proteção dos trabalhadores. Basta recordarmos que há pouco mais de 50 anos férias, descanso no fim de semana ou horários de trabalho eram conceitos ignorados pela maior parte dos trabalhadores. Depois de um período em que todos gozámos os frutos dessas conquistas, vem outro em que tudo é posto em causa. E os sinais que vamos recebendo são preocupantes: o fator trabalho tem sido – pelo menos no nosso país- fortemente desvalorizado, em detrimento do fator capital. E isto ocorre numa época em que todos estamos adormecidos pelo doce perfume dos privilégios que sempre conhecemos. Veja, a título de exemplo, que o Estado cortou os pagamentos pelo trabalho aos seus trabalhadores, mas não cortou os pagamentos por capital aos seus financiadores. Ou seja, mais uma vez a história repete-se: o capital encontra-se concentrado nas mãos de poucos e tem o rosto mais oculto do que nunca, com os grandes fundos globais de investimento a serem o rosto invisível de um poder que tudo pretende submeter à lógica da rentabilidade. E o trabalho está de novo disperso, porque as pessoas afastaram-se das organizações que tradicionalmente os representavam nesta luta – os sindicatos, com grande culpa destes, que não tiveram a capacidade de se adaptar às novas realidades dos tempos que vivemos. Porque o facto de a história se repetir não quer dizer que tal ocorra em contextos exatamente iguais, e os sindicatos não tiveram a lucidez de perceber as diferenças e de se recolocarem no tabuleiro de jogo por forma a tirar partido das novas condições. Exemplos disso mesmo foram as comemorações promovidas para este dia: fórmulas repetidas anos a fio, com a previsibilidade e a rotina a liquidar à partida qualquer hipótese de fazer chegar aos destinatários uma mensagem mobilizadora. Espero que o dia que ontem se celebrou possa ter feito alguns refletir sobre o caminho que as coisas estão a levar. Alguns que possam servir de inspiração para mobilizar aqueles a quem a revolta começa a incomodar seriamente para uma tomada de posição clara face à situação que se vive. Para, quem sabe, novas formas de encarar a defesa do trabalho face às agressões do capital…"

terça-feira, 12 de junho de 2012

Workshop “Vamos falar de sexualidade”

A Associação de Pais do Agrupamento de Escolas da Área Urbana da Guarda organiza na próxima quarta feira um workshop sobre o tema “Vamos falar de sexualidade”, em colaboração com a Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico da Guarda. Trata-se de um workshop destinado aos pais dos alunos do agrupamento para debater temáticas ligadas à sexualidade juvenil. A inscrição pode ser feita por neste email. Mais informações aquiSerá às 18.00H do dia 13 de Junho na Biblioteca da Escola de Santa Clara.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Concorrência

1. Em 2 praças da Guarda estão instalados ecrâs gigantes de video para as pessoas assistirem aos jogos do Europeu de Futebol; em ambos há esplanadas de bares; num caso foi um bar que pagou a instalação; no outro, foi a autarquia; acham que ambos concorrem em idênticas condições?

2. em 2 ginásios da Guarda o nº de clientes tem baixado devido à subida do IVA e ao agravamento das condições de vida que todos experimentamos; num deles, os gerentes têm de manter os pagamentos a fornecedores, fazer promoções e mesmo baixar o preço das mensalidades para poder subsistir; noutro, o preço consegue ser mais baixo que no primeiro, mas é explorado pela autarquia; acham que ambos concorrem em idênticas condições?

Se há áreas em que o investimento público é fundamental para assegurar o acesso a determinados serviços que não são financeiramente sustentáveis - o TMG é disso um claro exemplo e uma aposta da Câmara à qual reconheço um enorme mérito; outro será o complexo de Piscinas Municipais - outras há em que o investimento público desvirtua o mercado e faz concorrência desleal aos operadores privados. 
Por isso, é importante que se revejam os critérios exploração de atividades económicas por parte da Câmara.

domingo, 10 de junho de 2012

Crónica Diária - Rádio Altitude

Crónica de 18 de Abril:


"Na semana passada, a Câmara da Guarda resolveu reunir o Conselho Municipal de Educação. Trata-se de um órgão relativamente desconhecido, que ninguém parece saber quando foi reunido a última vez, variando as opiniões entre 2005 e 2006 – isto num órgão cujo regimento em vigor determina que reúna ordinariamente no início e fim do ano escolar! É órgão presidido pela Câmara da Guarda na figura do seu presidente, tratando-se de um órgão consultivo da Câmara em matéria de educação, cujas resoluções não são vinculativas e onde estão representados os diversos tipos de instituições envolvidos em matérias de educação – desde professores a assistentes operacionais, IPSSs, forças de segurança, Pais, etc. 
Os motivos principais da reunião foram 2: o encerramento de mais escolas do 1º ciclo na Concelho e a reorganização dos agrupamentos de escolas do Concelho. No que toca às escolas do 1º ciclo, de novo nos surgem algumas cujo nº de alunos é inferior a 22 (para a soma dos 4 anos), razão de se equacionar o seu encerramento. Embora ele vá, nalguns casos, sendo adiado, é muitas vezes quase inevitável. É difícil defender-se uma escola na plena aceção da palavra com um nº de alunos tão baixo; e com tendência a baixar ainda mais. E se é difícil de explicar por aqui, mais difícil ainda é perceber esta realidade num gabinete em Lisboa, rodeado de milhões de pessoas num raio de 10 ou 15 km. Ouvi há tempos, da boca de um Presidente de Junta do Concelho da Guarda, algo que define plenamente a tragédia que assola as nossas aldeias: dizia este Presidente de Junta que ele e outros colegas se defrontam com o encerramento das escolas das suas aldeias, ao mesmo tempo que com a necessidade de alargar os cemitérios. Dando uma imagem perfeita de para onde caminha o interior. Primeiro as localidades mais pequenas, a que se irão seguindo outras um pouco maior, até restar apenas um aglomerado macrocéfalo que poderá um dia ser a capital de um país completamente deserto, que a sua força centrífuga criou, de tanto puxar as energias – e os cidadãos – para o seu centro. Felizmente vão, aqui e ali, surgindo alguns movimentos que contrariam esta tendência predadora relativamente ao interior. 
O segundo assunto tratou da intenção do Governo de agrupar ou reagrupar escolas, criando escolas maiores. Para dar um exemplo, na Guarda poderão agrupar-se escolas de cerca de 1400 e 800 alunos, ficando no seu lugar uma nova escola com 2200 alunos. Pessoalmente, tenho as maiores reticências face a estes agrupamentos. Percebo bem a necessidade de mais eficiência na gestão de recursos e na logística, da existência de uma plataforma partilhada de equipamentos e procedimentos; mas parece-me que faria sentido equacionar soluções de unificação de back-office das escolas em detrimento da mera fusão de escolas. 
Um dos motivos pelos quais pretendo continuar a viver por cá é a educação e formação dos meus filhos. E nesta, um dos aspetos que tenho valorizado é o facto de conhecer as pessoas que os apoiam nas escolas, professores e pessoal auxiliar; de saber os seus nomes. E de me sentir reconhecido por eles. E este é um aspecto que vejo seriamente ameaçado com os agrupamentos que agora se anunciam. 
Na minha opinião, ambas as questões enfermam da visão de um conjunto de pessoas que não conhece outra realidade que não seja a das grandes estruturas: grandes escolas, em grandes aglomerados de população, com grande nº de recursos envolvidos. Porém, completamente descaracterizados, despersonalizados. E esquecendo que não é essa a nossa vivência, a das gentes das regiões mais afastadas das grandes cidades. 
Na Guarda, os ritmos são diferentes. Porque não moramos todos num bairro – apesar de cabermos num bairro de Lisboa, e precisamos de espaço e tempo para vivermos. Mas essa parece ser uma lógica que escapa a quem decide nestas matérias, admito que por ignorância, que terá como efeito que, mais dia menos dia, tenhamos mais alguns dos inconvenientes das cidades de maior dimensão, sem as respetivas vantagens. E na hora de equacionarmos se vale a pena cá continuar a viver, a nossa decisão poderá levar ao fecho de mais escolas, e ao alargamento dos cemitérios…"

sexta-feira, 1 de junho de 2012

MORTE

De novo a morte vai ser espetáculo na Guarda.
Quando nos mais diversos sítios do globo temos notícia de serem dados passos para o fim do espetáculo repugnante e lamentável que são as touradas, na Guarda parece que cada vez se investe mais nelas!
E de novo aí está mais um destes tristes eventos: a Câmara, através da Agência de Promoção da Guarda, vai organizar uma tourada no âmbito da Feira de São João.
No que a mim diz respeito, será um dia negro para a nossa cidade. Um dia em que se vai celebrar a morte de animais, montando à sua volta um espetáculo que considero repugnante e incompatível com valores do nosso tempo.
Costumo divulgar os eventos que por cá se vão realizando - no entrudo, no feriado municipal - e tenho convidado familiares e amigos para visitarem a Guarda nessas ocasiões. Fá-lo-ia também a propósito da Feira de São João - uma iniciativa que tem sido um bom exemplo de atração turística nos últimos anos - não fora esta desgraçada ideia de agora lhe pespegar uma tourada. 
No que se refere aos patrocinadores, não irei comprar um alfinete que seja a qualquer um deles durante este ano! Será a minha forma de protesto. Espero que outros se juntem a mim.
Uma última nota para dizer que espero das associações de defesa dos animais da nossa cidade uma posição clara sobre a realização deste evento.

Atualização em 10-6-20112: para além de patrocinadores, o cartaz do evento anuncia também um conjunto de media partners, entre eles a Rádio Altitude, com quem mantenho uma colaboração quinzenal. Informei já o diretor da Altitude que, a título de protesto, não gravarei a minha próxima crónica, que deveria ir para o ar em 13-06-2012.