terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Crónica Diária - Rádio Altitude

Já devo aqui ao blogue algumas crónicas que li aos microfones da Rádio Altitude, que teve uma vez mais a amabilidade de me renovar o convite para quinzenalmente estar naquele espaço de intervenção cívica.
Aqui fica a primeira da temporada; as outras, seguem dentro de momentos...

"Vivemos dias agitados. O vento forte que se tem feito sentir deixa-nos apreensivos. Coloca-nos questões. Coloca-nos perante os nossos medos.
Não me refiro ao estado do tempo, no sentido meteorológico. Refiro-me ao verdadeiro furacão que têm sido as notícias dos últimos meses.
Aquilo que ainda há um ano nos parecia pessimismo, é hoje a realidade; e o pessimismo de hoje mostra-nos algo com que nem sequer ousámos alguma vez sonhar!
É pois o tempo de tomarmos atitudes colectivas: de percebermos onde o individualismo e a falta de um projecto comum nos vão conduzir: a sermos marionetas nas mãos de um conjunto de agiotas sem rosto que tudo podem e tudo fazem a coberto do livre funcionamento dos mercados.
Começa a ser preocupante assistir, como temos assistido na Grécia e, mais recentemente, em Itália, a nomeações de Governos que não resultam directamente da vontade expressa dos povos. Como se a Democracia também pudesse ser posta em stand-by para “acalmar os mercados” – um expressão que pretende representar um objectivo que tudo justifica.
Mas há algo que essas entidades sabem e que as assusta: a força que representam os cidadãos quando unidos em torno de um objectivo comum. Por isso os diversos agentes políticos tudo têm feito para dividir as pessoas: os professores e os outros; os juízes e os outros; ou os funcionários públicos e os outros. Deixando sempre de fora alguns que ficam assim numa lógica de contrapeso a medidas duras e que, com o seu silêncio legitimam as injustiças que se cometem por incapacidade de tomar as medidas verdadeiramente estratégicas e cujos efeitos a prazo permitiriam corrigir muitos dos desequilíbrios que hoje nos afligem.
Como já havia aqui referido em crónica anterior, como podemos contar com solidariedade europeia se nem à escala do nosso (pequeno) país podemos contar com essa solidariedade? Veja-se o exemplo da Câmara de Barcelos, cujo Presidente anunciou há semanas que era sua intenção proceder ao pagamento de Subsídios de Férias e Natal em 2012 porque a sua Câmara tinha folga orçamental para tal. Sem a noção de que a Câmara de Barcelos não é a sua quinta, onde põe e dispõe; sem a elevação de perceber que essa suposta folga orçamental poderia ajudar no momento difícil que atravessamos. Que país é este onde uns quantos insistem em manter privilégios, mesmo que olhando para o lado se vejam dificuldades aflitivas? Se os mais desfavorecidos não podem contar com o emprenho de Barcelos, deverão confiar no empenho de Bruxelas?
Esta união em torno do objectivo comum de mantermos a nossa autonomia política é exigente em termos de cidadania. Mais do que nunca, é preciso estar atento ao que nos rodeia, reflectir sobre ele e conhecer a história e as lições que ela nos transmite.
Em momentos de aflição, os povos que depositaram a sua confiança em líderes messiânicos, em salvadores omniscientes, acabaram por dar os piores passos, porque confiaram inteiramente neles e deixaram de confiar em si próprios. E por muito iluminadas que sejam algumas consciências, não podem substituir, em nenhum momento, um conjunto alargado de consciências com diversas vivências, tendências e pontos de vista que são afinal aquilo que caracteriza a diversidade da pessoa humana e um dos pilares sobre os quais assenta a Democracia: o de que a minha opinião de Homem simples tem o mesmo valor que a opinião de qualquer Homem que se considere ou mesmo seja por outros considerado um iluminado.
Mantenhamo-nos pois atentos e sem medo de exprimir as nossas opiniões, pois só elas poderão distinguir os fortes dos fracos. E num momento difícil como o que atravessamos, Portugal – que somos nós todos – precisa muito dos fortes para seguir em frente."


Crónica de 16 de Novembro de 2011

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