quinta-feira, 22 de abril de 2010

Eles querem tudo!

Ouvi hoje de manhã, na rádio, a indignação do Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos por estes terem sido incluídos no pacote anti-corrupção que amanhã o Partido Socialista apresentará na Assembleia da República, visando impedir que os médicos acumulem funções no sector público e no sector privado.
O Sr. Bastonário acha mal, porque os médicos não estão envolvidos em esquemas de corrupção e, a terem de optar, optarão pelo que lhes pagar melhor que, segundo ele é o sector privado, abandonando assim o sector público.
O Sr. bastonário profere obviamente estas palavras para defender os interesses corporativos da classe que representa.
Acho francamente que a medida só peca por tardia! E nem vejo necessidade de nova lei; a actual já prevê que um funcionário só possa acumular funções com a autorização da sua entidade patronal; o que sucede é que as entidades patronais - o Estado ou alguém agindo em seu nome - autoriza sem critério este tipo de situação. E quem diz a médicos, diz a enfermeiros ou farmacêuticos, para citar alguns dos exemplos que melhor conheço.
Por princípio não me oponho a que alguém possa ter mais de um emprego; se alguém tem energia e ambição, oportunidade e capacidade para desempenhar bem as suas funções em mais de uma entidade empregadora, deve fazê-lo livremente. O que não posso concordar é que uma pessoa exerça determinadas funções numa entidade e vá, no final do dia, exercer essas mesmas funções numa entidade concorrente. Por exemplo, acho muitíssimo bem que um médico acumule as suas funções normais com a docência; agora ir dar consultas, no final do dia, para uma clínica privada, já não posso concordar. De resto, esta promiscuidade só existe no Estado, em que as chefias não são responsabilizadas por este tipo de situação. Não existem concerteza casos de clínicas privadas que empreguem clínicos a tempo inteiro e os autorizem a prestar serviços na concorrência. Já nos casos em que os clínicos exercem a sua actividade como profissionais liberais é completamente diferente, porque ai há apenas prestação de serviços, sem dependência hierárquica, podendo acumular livremente.
É que esta promiscuidade leva a situações como por exemplo uma que já testemunhei: acompanhando a minha mulher grávida a uma ecografia no Hospital, assistimos ao ultraje de primeiro terem sido chamadas todas as clientes do consultório particular de um determinado médico, e só após isso terem sido chamadas as doentes seguidas no Hospital, por esse médico ou outros! Isto num Hospital Público, onde todos os doentes têm de ser tratados por igual!
Esta promiscuidade é portante lesiva para o interesse público.
Dizia no final o Sr. Bastonário que os médicos optarão pelo que pagar melhor, que são os privados. A isto chamo bluff! O sector privado paga melhor porque paga horários parciais ou a recibo verde; nos casos em que emprega a tempo inteiro, as coisas já não são exactamente assim, como o Sr. bastonário decerto sabe... Além de que o sector privado não tem em Portugal uma dimensão que lhe permita absorver todos os médicos que queiram exercer essa opção.
Em suma, a medida parece-me bem positiva e espero que se estenda a outras classes profissionais; acho bem que as pessoas possam acumular empregos, mas não fazendo concorrência à sua principal entidade patronal, seja ela quem fôr.

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